domingo, 17 de junho de 2007

Pensar Abril, 1ª versão



I
Viva o 25 de Abril.
Viva Liberdade.

Viva o Zeca que nos fêz acordar de uma longa noite de trevas.
Viva a voz audaz de um povo, até então, calado e adormecido.
Viva a consciência dessa voz que nos iluminou o futuro.

O futuro?
Que futuro?
O da politica demagógica?
O da falsa democracia?

Viva o futuro que já não se silencia.
Viva o futuro da expressão de todas as cores: rosa, laranja, vermelho, verde, amarelo…

Viva o eco de pensamentos outros,
Do diálogo ou da conversa fiada,
Da trama das ideologias e da teoria da inexistência das ideologias.

Viva o amor e a paz, sempre adiadas,
Mesmo depois do fim da guerra colonial,
Dos homens mutilados,
Dos corações de mulheres despedaçados;
Das almas das crianças órfãs,
Que assim nas ceram à luz da promessa de uma nova idade.

Viva o 25 de Abril!
Viva a Liberdade!


II

Vinte e cinco anos passados.
Restam-nos as memórias dos horrores da Guerra,
De uma sociedade que, em nome dos cravos vermelhos,
Um dia ousou gritar: Liberdade.

Liberdade:
Essa palavra de ordem que fez cair um Regime eternamente enraizado,
Que arrancou, com todas as armas, a tirania dos pretensos opressores.

Liberdade:
O sinal do dizer aberto,
Há muito ocultado, pelo véu da falsa ordem,
Há muito camuflado, sobre a tríade,
Deus, Pátria e Família;

O sinal do dizer aberto,
Há muito velado, nos meandros da paupérrima cultura de um povo,
Que convinha manter ignorante, analfabeto …
Em nome da ausência do espírito crítico,
Da mente desperta e do pensar astuto.

Vinte e cinco anos passados.
E aqui estamos nós, quiçá em uníssono,
A comemorar,
Com milhares de cravos vermelhos,
O grande acontecimento da Liberdade.

III

Volvidos 25 anos.
Já não somos os mesmos.

Avistamo-nos com um outro rosto;
O rosto da política da integração europeia;
Da integração comunitária,
Da moeda única,
Da adaptação ideológica.

O rosto, quiçá, da desintegração cultural é apátrida.
O rosto, cuja voz, já não sabe cantar o hino nacional.
O rosto, cujos traços e as cores,
Já não são, talvez,
Os da nossa bandeira.

Volvidos vinte e cinco anos.
Já não somos os mesmos.

E o que somos, então?
Um povo errante,
Ainda e sempre no resto da cauda do mundo,
Que outrora conquistámos,
No preciso momento em que o perdemos.

Erguemos o Convento de Mafra,
Com o ouro vindo do Brasil;

Edificámos a Torre de Belém
E o Monumento das Descobertas,
À custa de longas e saudosas lágrimas,
Dos que sempre partiram
E dos que sempre ficaram.

Qual Velho do Restelo se ousa, ainda, erguer?
Qual Adamastor, povoa, ainda, os nossos mares?
Quais ondas alterosas se erguem, ainda, desse imenso mar?



Isabel Rosete
24.4.1999