quinta-feira, 14 de abril de 2011

Vagueamos por todos os caminhos

Aqui estamos nós, Homens,

Um dia rotulados de “animais racionais”.
Supostamente pensantes,
Supostamente equilibrados,
Supostamente sensatos,
Prudentes, previdentes,
Detentores de um raciocínio lógico-discursivo.
Hipoteticamente emersos,
No melhor dos mundos possíveis.

Afinal, o que queremos de nós,
Meros seres errantes?

O que queremos do Mundo
Que em torno de nós se desloca
A uma velocidade incomensurável?

Que intentos nos movem?
Por que causas lutamos?
O que desejamos?

Apagar essa aura de entes onde, um dia,
Fomos depositados, sem que o nosso querer
Fosse chamado a opinar?

Varrer este modo de Existência
De caos e de ordem indeterminados?
Abolir esse estado epimetaico
E prometaico
Que sempre nos acompanha?
Remover os des-equilíbrios
De que somos co-autores e co-produtos,
Voluntária ou involuntariamente?

Perdemos o rumo, a direcção.
Vagueamos por todos os caminhos
E o fio de Ariana,
Que comanda o nosso Destino,
Não encontramos mais.

Destino? Mas, que Destino?
O de sermos meros pedaços enredados
De uma humanidade enlaçada
Nas maquiavélicas malhas da sua própria teia?

Ariana e a Aranha estão sobre a caução
Do mesmo invólucro.
Tão opaco, quanto transparente,
Tão sublime, quanto miserável,
Tão glorificador, quanto condenável.

Mesmo assim, ainda podemos falar
Da harmonia heracliteana dos contrários?
Do caos criativo que Gera a ordem
Deste Mundo incógnito?

Isabel Rosete

PENSAR ABRIL II

Trinta e sete anos passados.
Restam-nos as memórias
Dos horrores da guerra,
De uma sociedade que,
Em nome dos cravos vermelhos,
Um dia, ousou gritar:
Liberdade.

Liberdade:
Qual palavra de ordem
Que fez cair um regime
Eternamente enraizado.

Liberdade:
Qual palavra de ordem
Que arrancou,
Com todas as armas,
A tirania aos pretensos opressores
De um poder adulterado.

Liberdade:
O sinal do dizer aberto,
Há muito ocultado,
Pelo véu da falsa ordem,
Há muito camuflado,
Sob a tríade
Deus, Pátria, e Família.

Liberdade:
O sinal do dizer aberto,
Há muito velado,
Nos meandros da paupérrima Cultura
De um Povo
Que convinha manter calado.

Calado? Sim, calado!
Em nome da ausência
Do espírito crítico,
Das mentes despertas
E do pensar astuto.

Trinta e sete anos passados
E aqui estamos nós,
Quiçá, em uníssono,
A comemorar,
Com milhares de cravos vermelhos,
O grande acontecimento da Liberdade.

Isabel Rosete

PENSAR ABRIL I


O 25 de Abril,
A Liberdade na ponta
Das espingardas com cravos vermelhos,
A esperança pela Tolerância
E pela fraternidade,
O Zeca Afonso das baladas
De intervenção
Que nos fizeram acordar
De uma longa noite de trevas.

O 25 de Abril,
A voz audaz de um povo,
Até então, calado,
Adormecido
Pelas vozes tirânicas,
De um poder sem dó.

O 25 de Abril,
A consciência de uma voz,
Aberta,
Que nos iluminou o futuro.

O futuro? Que futuro?
O da política demagógica?
O da falsa democracia?

O futuro? Que futuro?
Que já não se silencia?
O futuro da expressão
De todas as cores?
O futuro do rosa, do laranja,
Do vermelho, do verde?

O 25 de Abril,
O eco de pensamentos outros,
Do diálogo,
Ou da conversa fiada,
Da trama das ideologias
E da teoria da inexistência das ideologias.

O 25 de Abril,
O amor e a paz,
Sempre adiadas,
Mesmo depois do ilusório apogeu
Da bem-dita guerra colonial,
Dos homens mutilados,
Dos corações de mulheres,
Despedaçados,
Das almas das crianças,
Órfãs,
Que assim nasceram,
Á luz da promessa
De uma nova idade.

Isabel Rosete

PENSAR ABRIL III


Volvidos trinta e sete anos,
Já não somos os mesmos!

Somos quaisquer outros
Abandonados pelos políticos
Insanos do tachismo e da tagarelice,
Pelas pardidarices que, sem
Esperança, nos des-governam.

Peregrinamos pelos espaços
Vazios do Mundo, em crise
Consagrada pelos falsos
Mentores nacionais, de promessas
Sempre adiadas,
Avistando-nos com outro rosto:

- O rosto da política
Da integração europeia
E da vã inclusão comunitária.

- O rosto da moeda única,
Da farsa da adaptação
Ou da massificação ideológica.

-O rosto da desagregação
Cultural e apátrida, movida na
Mera verossimilhança de um
Povo sem identidade.

- O rosto, cuja voz,
Já não sabe mais cantar
O hino nacional.

- O rosto, cujos traços e cores,
Já não são mais
Os da nossa bandeira.

Volvidos trinta e sete anos,
Já não somos os mesmos!
O que somos, então?

Um povo errante,
Ainda e sempre,
No resto da cauda da Mundo,
Que outrora conquistámos,
No preciso momento
Em que o perdemos?

Erguemos o Convento de Mafra,
Com o ouro vindo do Brasil,
Edificámos a Torre de Belém
E o Monumento das Descobertas,
À custa de longas e saudosas lágrimas
Dos que sempre partiram,
Dos que nunca chegaram!

Qual Velho do Restelo
Se ousa, ainda, erguer?

Qual Adamastor
Povoa, ainda,
Os nossos mares?

Quais ondas alterosas
Se aprumam,
Nesse mar imenso,
Por onde não velejamos jamais?

Isabel Rosete