O
BEIJO DA ESCRITA E DA TERRA, por Isabel Rosete
Escrevo
na doçura de um beijo,
Na meiguice do olhar dos outros
Meus pares na sinceridade do ser-se,
Nos comoventes espaços silenciosos
Dos entre - sons da linguagem originária,
Nas pausas suspensas da escrita
Das palavras ditas e não-ditas
Em estados de espírito de uma certa alegria
Pela gratuitidade da Existência primeira,
Ou de depressão e a náusea, de inquietação
E revolta face aos desajustes deste Mundo
Hipócrita e insolente, que só me provoca
cansaço.
Mas... que cansaço! Mas... que cansaço!
Mas... que cansaço, este de ser poeta
consciente!
Mas... que cansaço, este de ser poeta vidente!
Mas... que cansaço, este de ser poeta da lúcida
[Embriaguez
do ópio!
Ah, como de dói este cansaço do sobreviver
Por entre as ervas daninhas dissimuladas,
Espalhadas como pragas de mosquitos por
[todos
os lados,
Minando os terrenos férteis da Verdade!
Escrevo no seio do Grito Universal do
Pensamento,
Nascente musical dos interstícios da Terra silente.
Aí estas, ó Terra, debaixo dos nossos pés,
Que te espezinham ou alisam no carinho de uma bênção;
Aí estás, ó Terra, ao alcance das nossas mãos,
Que te destroem ou salvam no dom da dádiva.
Aí estás, ó Terra, rodando em torno do teu próprio
círculo;
Aí estás, ó Terra, rodando em torno de todos
os outros
[círculos possíveis;
Aí estás, ó Terra, rodando no Aberto de todos
os Pensamentos
[redondos,
Que aniquilaram os Pré-conceitos das vexadas
mentes
Quadradas, estagnadas nos domínios da
Vã-Glória.
Isabel
Rosete, Ílhavo, s. d.
Figura: Escultura de Rodin, "O Beijo"