sexta-feira, 25 de janeiro de 2008

Procuro a Inocência e a Beleza

Procuro a inocência e a beleza
Em cada alvorecer
Em cada olhar…

Em cada gesto
Em cada expressão
Por mais simples
E singela que seja…

Procuro a paz
Em cada ente
Que cruza
O meu caminho…

Tão errante
Como o das
Aves migratórias…

Encontro o meu Eu
Permaneço em estado de graça…

A tranquilidade assoma
O Mundo
Avança
Em perpétua mudança…

Escuto o canto dos pássaros
Tão virgem
Como o da Terra imaculada
Que a minha alma sossega…

Procuro o Infinito
Contemplo as estrelas
Que tudo iluminam
Até os meus passos
Em calçadas escorregadias…

Desperdiço o afecto dos outros
Centro-me em mim
Nas minhas paixões
Vividas e por viver…

Desponta a ânsia do futuro
Do devir
De um tempo outro…

Tudo corre em infinitas direcções
Num tempo e num espaço
Que me escapam
Mesmo que os viva
Intensamente…

Procuro o Universo em mim
O Mundo não me basta…

É demasiado pequeno
Para comportar os meus infinitos desejos…

Uma espécie de megalomania universal
Percorre todo o meu ser…

Prenhe de pensamentos
De ideias
Claras e distintas…

Movem-se num campo
Aberto
Sem fronteiras
Sem limites
Sem obstáculos…

Sou livre
O Universo espera-me…

Celebro o reencontro derradeiro
Com o Uno primordial…

Isabel Rosete
31/05/ 20007
26/01/00

Quantos são os mistérios da escrita

Quantos são os mistérios da escrita
No seio da imensidão
Do nosso universo linguístico…

As pausas
Os silêncios…

Sempre as palavras
Que nos comovem
Ou nos fazem explodir…

Sentimos o enigma do mundo
Na sua dis-persão e re-união…

Uma inquietante estranheza inicial
Coloca-nos na face dos mistérios
Insondáveis
Da Natureza
E do Homem…

Ficamos atónitos
O silêncio regressa
Apesar de toda a prosologia…

Iniciamos a próxima viagem
Em todo o nosso peregrinar
Tão genuíno como o canto dos pássaros…

A todo o instante
Fazem escutar
Os seus hinos de celebração da Terra
Que sempre acolhe os nossos passos
Tão pesados quanto a massa do Mundo…

Caminhamos para uma nova era
E nunca sabemos
Para onde correm os rios…

Os rios do “obscuro” de Éfeso
Que nos doou essa maravilhosa metáfora
Da sucessiva transformação
De todas as coisas…

Sempre outras…
Sempre outras…

Sempre as mesmas…
Sempre as mesmas…

Num eterno retorno
Marcado pelos traços
Da esmagadora infinitude…

Isabel Rosete
27/02/2007
25/01/08

Amo...

Amo
Não sei bem o que amo

Tenho medo de voltar a amar
De voltar a sofrer
De voltar a sonhar

As ilusões crescem
Quando se ama

Emerge a dor
A insatisfação
A insanidade e a insensatez

A cólera aflora
A presença ausente de um outro estado
Sempre inacabado
Sempre adiado

Caminhos que não conduzem
A parte alguma
Espreitam-nos no amor

Nos caminhos
Que se bifurcam
Perdemo-nos
De nós
E do outro

Encontramos o desfiladeiro
Assoma o vazio
De uma alma deserta
Dispersa
Em “con-fusão”

Alienada pela adrenalina
Que sobe
Escorrega
Desampara
Inquieta…

O êxtase da alma
É intolerável
Em qualquer paixão

As mãos tremem
Transpiram

O coração
Consome-se
Num ritmo
Acelerado
Incontrolável
Incontornável

O estômago
Já não se contém
Com tanta ansiedade

Calafrios
Pela coluna
Sobem e descem

Tudo se move
Tudo se transforma
A um ritmo
Desenfreado
E imparável

Assim é o amor
Força
Que move e comove
Despista
Rói
Corrói

Cego e surdo
Táctil e visual
Transporta-nos
Para a realidade
Do possível
Para o possível
Do impossível
Para o imaginável
Do inimaginável,
Para o sonho
Do “in-sonhável”

Para as correntes tumultuosas
De um mar sem fim
Para o infinito
Do próprio finito
Para a alucinação
Da sensatez

Para a irrazoabilidade
Do razoável
Para o ilimitado
De todos os limites
Conscientes
Ou inconscientes

Assim é o Amor
Uma força tremenda
Gigantesca
Arrebatadora
Desmedida
Enorme

Dentro de um tempo redondo
De um eterno retorno
Do mesmo e do outro
Com princípio e fim

Isabel Rosete
26/05/07
15/01/08

quinta-feira, 24 de janeiro de 2008

Saudade...

Saudade
Da infância que não tive
Dos amores que não vivi
Dos sonhos que não sonhei…

Nostálgica, estou
De um mundo não visto
De um Paraíso não conquistado
De uma existência não saboreada…

Isabel Rosete
15/01/08

Vivemos num mundo ...

Vivemos num Mundo…

Jamais feito à nossa medida
Castrador dos pensamentos
Livres e abertos
Soltos e críticos…

Intransigente
Para com os actos mais arrojados
Divergentes
Destoantes
In-habituias…

Que não comporta a excentricidade
Nem a identidade
Nem a alteridade
Nem a diversidade
Nem a diferença…

Vivemos num Mundo
Do dogmaticamente imposto
Do imperativamente instituído
Do inconscientemente convencionado…

Isabel Rosete
18/10/07
15/01/08

Amores ...

Sempre em ânsia
Pela hora
Da chegada
Dessa criatura
Que tanto amo…

Criatura?
Sim.
Porque não?

Todo o ser humano
É uma criatura
Uma bênção de Deus
Ou uma dádiva da Natureza

Trabalho
Penso no seu rosto
A cada instante
Nesse jeito calmo de ser
Com um cheiro de malícia
Repleto de sensualidade

Esta alma vive intensamente
Cada momento
Da sua existência
Individual e colectiva
Como se cada instante fosse
O último do resto da sua vida

Respira e expira a própria vida
Sempre a inspira
Pelas largas narinas
De um rechonchudo nariz
Postado no seu rosto moreno
Moreno – bombom

Aí estão apensos uns profundos olhos negros
Que vêem sempre mais longe
Nos olhos dos outros
Quando os observa
Na mais profunda intensidade

Sem pestanejar
Tão fixamente
Como as estrelas
Que no céu estrelado
Mantêm o seu brilho
Denso
Quase eterno

São pérolas negras
Fustigam o meu olhar
Trespassam-me
Visceralmente

Há uma certa magia
Em todos os seus actos
Em todos os seus gestos
Na sua voz grave
Doce e terna
De sons gerúndios

Essa magia apaixona,
Fascina
Atrai
Como um hímen
A limalha de ferro

Penetra-me
Indelevelmente
Envolve-me
Num misto de sedução
De prazer
De felicidade
E de ansiedade eterna

Perpetua-se em cada sinal
Em cada movimento
De um corpo deambulante
Exemplificante da singularidade
Da alma que o habita
Tão livre como a ave
Que pode abandonar a sua gaiola
Mas não mais a sua prisão

Vagueia
Quiçá
Sem destino
Pelas múltiplas paragens da Mundo
De todos os destinos humanos

A atracão que exerce
Estranhamente intensa
Torna-se inexplicável
Indizível
Inefável
Pertence ao domínio inviolável do SENTIR
Excede todo o campo semântico

Tem um toque diferente
Como se pertencesse a outro espaço
A outro tempo
A um outro lugar

Extravasa a vulgaridade
De todas as possíveis vivências quotidianas
Mantém tudo no seu preciso lugar

Em si residisse
Um topos singular
E todo o desvio é assumido
Como uma violação inevitável

A sua presença
Tão envolvente
Tão cheia,
Tão redonda
Nada deixa de fora

Aí permanece
Como a aranha
Na sua própria teia
Os seus movimentos
Rodopiam nas malhas
Dessa gigantesca trama
Abrangedora de tudo o que o rodeia

O seu estar
Presentifica o próprio Universo
Só existíssemos os dois

A realidade
Entra em nós
Totalmente
Nada,
Absolutamente nada
Pode estar fora do nosso alcance

Emerge a sensação do Absoluto
Da Totalidade
Nós
E o Mundo
Somos o mesmo

Todas as dualidades desaparecem
A união das partes é plena
A divisibilidade não tem lugar

Em nós
Permanece o Cheio
O Aberto
Em perfeita comunhão

E a Vida,
Apesar de todas as adversidades
Torna-se tão simples
Tão singela
Tão leve
Tão radiosa
Tão apetecível

O sono
O sonho
Não é mais efémero
Resplandece
Num eterno momento de serenidade
De paz
Tão sólida e inevitável

Permanecemos em união
Até ao íntimo do nosso Ser

O Mundo
Penetra-nos
Na mais pura e bela gratuitidade

A “paz perpétua” assoma
Onde se gera a agonia
A ansiedade
A angústia
Quando extravasa
Pelo álcool
O néctar dos deuses
Os limites da racionalidade
Da sobriedade
Da consciência

São esses os momentos de excesso
Da pura embriaguez catártica
Dessa criatura que tanto amo

Os meandros
As fronteiras
Do seu pensamento,
Esbatem-se
Até às lágrimas

As ideias
Os sentimentos
Os pressentimentos
Flúem
Transbordam
Como um rio
Do seu próprio leito


Nele
Um desregramento de caudal
Que só a embriaguez faz despoletar

Volta ao silêncio
Ao silêncio da voz
Nunca
Ao silêncio do pensamento
São momentosos de introversão
De uma lama que está para além de si

A catarse da embriaguez
Voltará
Brilhará
Com tanto sofrimento
Com tanta angústia

O mundo parece desabar
A queda é efémera
E do caos se ergue
De novo
A ordem

“Acorda para a realidade”
Com a necessidade
De se evadir

É o comportamento característico
De todo o ser sensível e consciente
Das atrocidades da Existência humana
Em permanente sobressalto

Urge esquecer tudo
Entrar numa outra ordem
Num outro espaço
Trazido por todos os alucinogénios

A ressaca
Não é assim tão terrível
A lucidez nunca é
Perdida
Apenas desviada
Para outras paragens
Que a imaginação
Requerer percorrer

O Mundo
Os Homens
Obrigam-no a esse esquecimento
Em prol da mais efémera ilusão de serenidade

Nesses momentos
Torna-se um outro de si próprio
O seu corpo
Lânguido
Derrubado
Perde toda a sua volúpia magistral

Vacila entre o Ser e o Não-ser
Entre o Tudo e o Nada
Penetra
Hiperbolicamente
Nas entranhas de tudo
Qual cobra
No seio do silvado
Depois de estarrecida

Aí permanece exposto
Desarmado
Exausto
Não tem mais forças
Para se erguer
Quebrou todos os escudos
Tornou-se indefeso

Confunde-se com o próprio chão
Onde caiu
E amoleceu
Instantaneamente
Aí permanece estendido
Com um olhar amortecido
Semicerrado

O excesso assoma
Espelha a aura
Invisível da sua alma
Dissolvida
Despedaçada
Espera um outro reencontro
Um outro renascimento
Entre tantos outros já passados
Entre tantos outros que
Se adivinham…

Isabel Rosete
(Dedicado a um ente muito querido, já falecido pela embriaguez do álcool)
02/02/01
15/01/07