terça-feira, 25 de dezembro de 2012

Volto ao ímpeto criador do Mundo, por Isabel Rosete




Volto ao ímpeto criador do Mundo. O princípio e o fim juntam-se. O Todo emerge, completo, em todas as suas partes.
A fragmentação do cosmos não passa de uma ilusão óptica, de uma sensação de fraqueza ou de deficiência do olho que não vê a totalidade tal como ela é e existe, aquém ou para além da finitude da visão humana.
Nada está dividido. Nada está separado. A união dos elementos é o composto do Todo deste Universo infinito contextualizado em si, mas continuamente descontextualizado em nós, criaturas bi-céfalas e míopes.
Só a visão esferoidal pode abranger a totalidade, da qual apenas vemos pequenos pedaços dis-persos, sem ordem aparente, sem ligação possível, qual puzzle desfeito em peças soltas, num tabuleiro ilimitado sem eventual possibilidade de agregação.
A nossa visão fragmentária parcializa a unidade da Realidade e, por extensão, da sua Verdade. O que é e o que não-é nessa óptica parcializante da percepção desmembrada. Raramente conseguimos atingir a adequação entre o que vemos (ou julgamos ver) e o modo como as coisas e os factos estão consumados e se nos presentificam (tal como supostamente são).
Há a fantasia, a ilusão e a ilusão da percepção, a ilusão da ilusão; há o des-virtuamento do ver, que trás a confusão dos múltiplos prismas possíveis sobre a Realidade que, quiçá, é apenas uma só.
O olho infinito e omnisciente de Deus vê o Todo. Vê o Todo como Todo integralmente. Vê o Todo como Todo incluindo, distintamente, todas as suas partes, em união e separação. É a visão integral e integrada. É o Todo.

Isabel Rosete, Praia da Barra, 18/08/2010 (ao Pôr-do-Sol)

Hoje a noite está escura e quente, por IR



Hoje a noite está escura e quente, agradável para o surgir espontâneo do Pensamento. Apenas algumas estrelas pairam, aqui e ali, como focos fixos de uma intensidade luminosa e constante, nesse céu de um denso azul, quase negro, quase misterioso, quase insondável.
Umas brilham mais; outras menos. Umas estão voltadas para mim e alumiam, indelevelmente, o papel onde escrevo; outras, viradas para direcções que não identifico, parecem-me inacessíveis. Mesmo assim, sinto-me iluminada por elas neste ponto tão distante da minha varanda de onde, fixamente, as observo, refrescando-me com a escassa brisa fresca que, de vez em quando, me vai chegando.
As árvores recortam o firmamento, tal como os telhados das casas, que daqui avisto sob várias formas, por entre as luzes eléctricas que as estradas clareiam.
É tão simples este meu estar aqui, na minha varanda, numa espécie de sossego musical que me harmoniza com estas formas ainda não adulteradas da Cidade e da Natureza, em perfeita união com o espaço cósmico, onde me sinto completamente integrada.
Só não ouço o canto dos pássaros, já recatados nos seus ninhos!
Como amo esta solidão que me trás a paz no fôlego aberto da escrita, que move o meu pensamento a exteriorizar-se, tal como ele próprio é e quer manifestar-se.
Nestes momentos de serenidade, nada o pressiona ou afasta do seu curso natural. Na sua solidão, diz-se sem atrofios. A sua liberdade é plena. Determina o seu rumo, os caminhos por onde vai.
Nestes momentos de quietude, nada tenho que me impeça de pensar na amplitude total do ser do pensamento.
Nestes momentos de tranquilidade, nada me impede de sonhar, de imaginar o Tudo, qualquer coisa deste ou de outro mundo qualquer. Aqui me amparo e ancoro.
Despeço-me, neste estado de interrupção da minha existência material, das amarguras da vida, daqueles pedaços de dor que tanto me atormentaram a alma e me contagiaram o corpo.
Nesta minha varanda ‑ assim deitada na cama de rede vermelha que me abriga o corpo ‑ suspendo-me. Suspendo-me literalmente. Entro no in-habitual. Vejo-me em mim mesma – por entre essas casas, essas árvores e esses postes eléctricos ‑, não como Narciso, mas no meu próprio Ego despojado de qualquer visão marcada pelo pré-conceito, por um outro, ou pela ilusão de um outro de mim, pela análise parcial do Eu para com o Eu.
Já não há reflexos, nem sombras, nem parêntesis… Apenas eu, completamente desnuda, no mais íntimo e veraz do meu ser, incompleto, nas franjas da sua própria invisibilidade total.
Eis quando surge, quando se revela ‑ depois de um estado de latência mais ou menos prolongada ‑ a minha verdadeira Identidade. É um processo recôndito de regresso a mim mesma, traçado na aura do mais enigmático de mim, aonde desço para, depois, me voltar a erguer, des-velando as minhas entranhas.
Por este modo de auto-conhecimento, nasce o amor-próprio no que ele tem de mais genuíno, original e originário; surgem todas as formas onde o Amor se dá, na comunhão do mesmo e do outro.
A Identidade e a Alteridade, o Eu e o Outro, comungam num mesmo ponto: aquele da suspensão e da introspecção do Eu, que o abre a si mesmo, em si mesmo, e ao outro, na mesmidade única. Sabendo-se assim, o meu Eu sabe o seu Eu e o Eu de todos os outros.

IR (semi-heterónimo de Isabel Rosete)


SEJAMOS NATAL

Para além de todas as demagogias,
Para além do politicamente correcto,
Para além de todas as hipocrisias...

Celebremos, finalmente, o Espírito do Natal
Em todos os momentos
Desta nossa existência, tão efémera!

Natal é: Fraternidade, Solidariedade, Paz,
Amor e Alegria na Terra
E nos Corações dos Homens;

Natal é: o louvor do autenticamente Humano,
Em toda a sua essência genuína
De Bondade e de Verdade;

Natal é: o enaltecimento de um Mundo
Onde não haja mais lugar para a Crueldade,
Para a Violência ou para a Agressividade;

Natal é: a reunião dos Corações sensíveis
Que lutam, desesperadamente, pela União
Dos Povos e das Nações;

Natal é: a rejeição da Discriminação,
Dos horrores da Guerra,
Da mutilação dos Corpos e das Almas;

Natal é: a consciência da Miséria Humana,
O compromisso da sua superação,
O enaltecimento da Justiça e da União fraterna;

Natal é: o triunfo do Bem e do Belo,
A glória de todos os Renascimentos,
A comemoração da Dignidade Humana;

Natal é: a bênção do sempre Novo,
O louvor de todo o acto de Criação,
De Renovação e de Regeneração.

Sejamos Natal,
Hoje, sempre,
Para sempre...

Isabel Rosete

sexta-feira, 5 de outubro de 2012



"TREVAS DA IGNORÂNCIA", por Isabel Rosete

"Mais um dia de Sol resplandece
Por entre as límpidas águas
- Deste mar onde lavo as minhas mãos,
Que agora escrevem no alvor da Criação -
Tão puras, tão instáveis, tão revoltosas...

Tão movediças e inquietantes quanto o próprio Homem.

Ah, mas..., já não há Sol a iluminar as mentes tenebrosas
Há muito minadas pelas trevas da Ignorância,
Esse estado próprio do pensamento vazio!

Ah, mas..., já não há Sol a entrar pelas vidraças
Húmidas e tristes das casas cinzentas
Votadas ao abandono pela (des)habitação do Humano!

Ah, mas..., já não há Sol a acalentar os corações jazidos
Pelo ódio ainda não arrefecido,
Pela vingança irreflectida dos espíritos acobardados!"

Isabel Rosete

"NAS ORELHAS O MUNDO", por Isabel Rosete

"Passo pelas ruas e não vejo as gentes.
Escuto apenas os seus pensamentos
- Ora de alegria, ora de medo
Ora de felicidade, ora de tédio -
Como um Anjo invisivelmente presente
Nas orelhas o mundo.

Por vezes, os pensamentos
Cruzam-se e interpelam-se
Nas teias intra-mundanas
Do espaço cósmico universal;
Por outras, correm em digressão
- Ora em sintonia, ora em des-fazamento
Ora em serenidade, ora em agonia –
Nas mentes aceleradas das cidades em combustão.

Aí estais gentes dis-persas,
Sós, em aparência des-apartadas,
Des-agregadas entre vós
E de todos os outros que também
Sóis vós na sua natural
Identidade e diferença específicas."

Isabel Rosete