quinta-feira, 18 de agosto de 2011


Chora mulher.

O teu homem foi levado pelo mar,

Enrolado no sal das águas que o conserva.



Mas…, espera. Não caias por terra.

Ninguém assim to ordenou.

Ainda não tens a campa.

Ainda não tens a lápide.

Ainda não tens as velas ou a lamparina.

Ainda não tens nem a floreira

Nem o crucifixo, nem o corpo.

Ainda não chegaram as carpideiras

Para contigo o chorar.

Ainda não chegou o padre

Para lhe dar a extrema unção.

Queres enterrá-lo de forma infame

Sem que ele se tenha redimido

Dos seus vastos pecados?



Não chores, ainda, mulher.

Talvez o teu homem venha com a próxima maré.

Espera-o na beira da praia.



IR, 16/08/2011


Ah, se o teu rosto se voltar a colar no meu,

Se as nossas almas derem as mãos,

Se os nossos corpos deslizarem

Na pele macia que nos une na diáspora,

Se me voltares a ver, ao fim da tarde,

Quando o ruído se torna silêncio,

Se me beijares de cor-de-rosa…!

Oferece-me rosas azuis,

Mesmo que sejam temerárias.



IR, 10/08/2011


A um amor perdido



Não sei se te ame, se te adore,

Se te venere, se te castre,

Se te mande para o Inferno.

O abismo impõe-se entre nós.

Ainda me corróis as entranhas,

Ainda me esmagas a alma

Envolta em cardos espinhosos.



Não sei se te odeie de um modo tão amargo quanto o fel,

Se te presenteie com Cicuta, essa mesma com que

Envenenas-te o meu sangue, agora roxo,

Com metástases de um sofrimento atroz.



Dizias sempre que, um dia, voltarias

Depois da purificação de todos os teus pecados

Amargos, sem perdão.

Que perdão? Deus já não te ouve!

És um intruso amaldiçoado,

Eternamente amaldiçoado por um amor

Que nunca tiveste, a não ser por ti próprio,

Na tua obsessão doentia,

Na tua incondicional posse de mim.



Não sou um objecto, não sou um biblô

Que mostras ao mundo como um troféu de caça

Que carregas nessas tuas mãos endinheiradas

E envelhecidas pelo mote das aparências indiscretas

Que sobrevivem em ti e nos outros sob a dissimulação

De um dito lar perfeito.



Se, um dia, voltares, não estarei aqui.

Talvez vagueie num qualquer cais incerto

Das emoções livres, onde as palavras

Jamais me doerão.



IR, 09/03/2011

Olhos azuis cintilam na brancura rosada

De uma face, ainda, imaculada.

São pedras preciosas

Inscritas no alvor da candura

De uma Alma tão grande,

Capaz de se dar ao esplendor do Universo.



Por debaixo dos seus finos lábios,

Sempre se rasga um sorriso luminoso,

Tão incandescente

Quanto a mais bela das estrelas

Deste Céu que, ainda, nos cobre.



Que doçura inspiram os que os olham

Na sua inocência libidinal

Tão pura, tão leve…

O mais ténue sopro

Pode arrastar o seu Espírito

Até às profundezas da Terra.



Sabe amar como ninguém!



Esses hipnóticos olhos azuis

Fazem transparecer

O amor verdadeiro em cada lento

E terno pestanejar.



Azul do Céu, azul do Mar, azul da Lua…

Azul que reflecte um singelo ser transparente,

Uma dádiva divina, a infinitude do Ser

Do estar, do amar…



Azul dos espaços siderais, azul do Infinito,

Azul do Ilimitado, azul de todos os horizontes…

Azul de todos os desejos, azul de todos os instintos,

Azul de todas as pulsões…



Azul de todos os amores, azul da Esperança,

Azul do olhar fixo e profundo, que tudo olha

E sempre vê.



Isabel Rosete









Breves constatações sobre um Portugal de demissionários:


1. Vivemos, hoje, num Pais de demissionários, de gentes sem rosto e sem voz própria, convicta ou determinada;

2. Vivemos, hoje, no silêncio mórbido dos que não sabem como salvar este País em marés de desalento, em estado de naufrágio total. Completamente alagados, na sua ausência de ideais, os mandantes ou (des)mandantes nacionais talvez seja este o termo mais adequado navegam, sem norte, nos mares da dissimulação, da mentira e do faz-de-conta, sem escrúpulos ou peso nas suas consciências inconscientes;

3. Vivemos, hoje, banhados por um regime político incógnito e, naturalmente, indefinível e impassível de qualquer espécie de adjectivação apropriada, porque: vagueamos na política da lamentável conveniência, do tachismo sem disfarce, da ausência da identidade nacional, do parecer-ser estatístico que pretende camuflar – pensam eles! – as misérias nacionais, apenas invisíveis perante a quadradice dos espíritos míopes.

Isabel Rosete

2010

O deliro das multidões sem rosto

Esgota-me a Alma.

Quanta Hipocrisia paira

Nos aglomerados das massas

Que lutam por arrastamento

Sem convicção própria.



Isabel Rosete

04/01/2009

Um dia de Sol resplandece

Por entre as águas cristalinas

Tão puras, tão imortais,

Tão ancestrais quanto o próprio Homem.



Mas, não há Sol

Que ilumine as mentes escuras

Travadas pelas trevas da Ignorância!



Mas, não há Sol

Que entre pelas vidraças,

Húmidas e tristes,

Das casas cinzentas

Votadas ao abandono

Pela (des)habitação do Humano!



Mas, não há Sol

Que acalente os corações jazidos

Pelo ódio ainda não arrefecido,

Pela vingança irreflectida

Dos espíritos acobardados!



Isabel Rosete